segunda-feira, 6 de maio de 2013

Artistas do brilho



Praça da Sé, tarde de um sábado de 2013. Muitos personagens, de variados gêneros. Um verdadeiro mosaico, com cores e novas sonoridades da cidade. Impregnada pela pressa e os abismos sociais. Turistas, plaqueiros, moradores de rua, músicos, pastores e alguns velhos engraxates. Aquele acariciar do pano no sapato, fez o tempo volver.

Ao som de Adoniran o sapato de cromo ia sendo engraxado, com a grande habilidade desse artista do brilho. Com escova, panos e graxa a obra de arte é feita. A fila exige a rapidez do processo. Homens de negócio alinhados sentam-se a cadeira. Trabalho não falta, nem ilustres presenças e boas histórias. Mas o tempo passa, assim como as pessoas no novo ritmo da cidade.

Permanece em sua cadeira, observando atento a mesma praça há 59 anos. Constata nostálgico a atual deselegância discreta. Os homens de sapato bacana e chapéu deixaram saudade a seu oficio.

Invisível para a maioria que hoje ali passa. Códigos da cidade que cresceu em ritmo amedrontador diante desses olhos inquietos. Antes praça, agora superpraça. A Sé que engoliu a vizinha praça Clóvis Bevilacqua para abrigar a principal estação da cidade. Antes tinha bonde, hoje o metrô .

Curvado, cabelo e barba branca. Boné protegendo do sol forte que faz no dia. Camisa larga amarela com os primeiros botões abertos, calça cinza e sapato marrom. Mãos manchadas pelo sol e marcadas pelo tempo, que continuam em atividade. Primeiro cliente do dia, aquele cliente de sempre. Velhos e seus costumes velhos. Duas barbas brancas vivendo a memória afetiva da cidade de outros tempos. O passado e o presente se permeiam em uma só camada, um transe compartilhado. O processo de lustrar os sapatos continua o mesmo, mas a praça e seus transeuntes não. Profissão que parece estar fadada a extinção na geração do tênis.

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