segunda-feira, 6 de maio de 2013

Relatório sobre a greve dos professores

               No dia 26/04 a Secretaria da Educação publicou uma nota de repúdio à greve dos professores da rede estadual de São Paulo, declarando que “é lamentável que a Apeoesp se paute por uma agenda político-partidária”. De fato, não estava mentindo. Conforme as eleições se aproximam, a disputa entre os partidos hegemônicos do país (PT e PSDB) fica mais acirrada, e todos meios são válidos, inclusive, a greve. Contudo, reduzir a greve ao interesse político-partidário da Apeoesp, que hoje tem sua cúpula dominada pelo PT, seria um equivoco prejudicial, visto que ela pode nos dizer muito mais.


                A manifestação dos professores na Avenida Paulista no dia 26/04 e no dia 03/05, se constituíram em duas vitórias, sendo uma eufórica e de pouco significado, e a outra trágica, mas com um significado extremamente valoroso. No dia 26/04, os manifestantes ( basicamente, professores do estado, estudantes secundaristas e estudantes universitários, estando neste dia em número maior do que nos outros), em honrosa ousadia, tomaram por completo a Avenida Paulista! Ocuparam as duas vias, causando quilômetros de congestionamento pela cidade de São Paulo. Em um depoimento no site da folha, uma cidadã descontente com o ato descreve que levou “uma hora e 20 minutos apenas para percorrer as 12 quadras que separam a avenida Brasil da Paulista”. Foi um ato efetivo na medida em que chamou a atenção e atrapalhou (literalmente, parou as ruas de São Paulo), e até mesmo subversivo visto que não estava nos planos da cúpula sindical da Apeoesp, e provavelmente, contrariava os interesses da mesma, se pensarmos no resultado que o ato causou na manifestação seguinte.

                No dia 03/05, foram tomadas todas as medidas para que a ocupação completa da Paulista não se repetisse. Quando a primeira via da Paulista foi tomada pelos manifestantes, os líderes da Apeoesp pediam pelo microfone para que ela fosse desocupada, ao mesmo tempo, pessoas do sindicato faziam esforço entre os manifestantes para que eles voltassem para o saguão do MASP (A APEOESP de Assis, nesse momento, declarou não voltar a levar os estudantes da UNESP de Assis para as próximas manifestações da greve dos professores, acusando-os de “radicalizar a greve”). Uma vez que os manifestantes não lhes deram ouvidos e a avenida permaneceu ocupada, formou-se um cordão de policiais militares impedindo a tomada da outra via.

                Durante a Assembleia, a cúpula da Apeoesp se esforçou ao máximo para amenizar os efeitos do manifesto, tentando, por exemplo, tirá-lo da Paulista, e falhou miseravelmente diante de um público que lhes negava todos os apelos. Sem sombra de dúvida, a questão mais significativa foi a da união da greve dos professores do estado com a dos professores municipais. Se, tal como disse a Secretaria da Educação, a greve dos professores foi puxada pela Apeoesp com o objetivo de pressionar o governo psdebista no Estado de São Paulo e chamar votos para o PT nas eleições de 2014, a partir do momento em que a greve dos professores do estado se unir com a greve dos professores do município, a Apeoesp (e o PT) teriam dado um tiro no pé, pois como a prefeitura de São Paulo é do petista Fernando Haddad, a greve, agora unificada, deixaria de ter um sentido partidário e passaria a se apresentar como ela realmente tem sido desde o começo: um manifesto popular de descontentamento para com a qualidade da educação pública.

                Mediante o perigo, a Sra. Bebel, presidente da APEOESP,  prolongou a Assembleia por 1 hora e meia gritando argumentos contra a união das duas greves, enquanto o povo respondia eufórico e incessante: “Unifica! Unifica! Unifica!” Quando finalmente as pautas se abriram para votação, foi decidida a continuidade da greve, e a cúpula da Apeoesp perdeu em sua proposta de tirar a greve da Paulista. Quanto a pauta da unificação da greve dos professores  do estado e município, num ato de omissão autoritária,  ela se quer foi aberta para votação!

                Quando a manifestação desceu a Paulista, agora presa a apenas uma via pelo cordão policial que a acompanhava, o carro de som da Apeoesp paralisou o andamento do manifesto para que ele não seguisse pela Avenida da Consolação, e entrasse na Bela Cintra. Sabendo o efeito negativo que causaria no ato, parte considerável dos manifestantes se negaram a atender ao pedido da Apeoesp, abrindo um novo momento de discurso da Sra. Bebel contra o povo de sua própria greve. Depois de quase meia hora de inércia conflituosa entre burocracia sindical e base popular, parte considerável dos manifestantes contornaram o bloqueio policial e seguiram pela Avenida da Consolação (momento onde houve pequenos conflitos também com a PM), mais uma vez, batendo de frente com os interesses da cúpula do sindicato dos professores. Apesar do ato de soberania popular, daí em diante um clima de desgaste e desânimo pairou sobre a manifestação, conseguindo até mesmo desviá-la de seu trajeto oficial quando perto da Praça da República.

                Apesar do clima trágico do fim da passeata política dos professores do estado, ela foi uma vitória de grande importância. Afirmo isso porque a Assembleia e a manifestação dos professores do dia 03/05 demonstrou a perda de controle total da base popular pela burocracia sindical! Base e sindicato, povo e burocracia, se mostraram como duas partes antagônicas, cada uma com interesses próprios e opostos. Mais do que isso, foi possível abrir espaço até para a crítica de uma crise da democracia parlamentar! O sindicato mostrou-se incapaz de defender os interesses dos trabalhadores, e pior, mostrou-se como um órgão de poder dotado de interesses próprios e opostos aos dos trabalhadores que deveriam representar. Por trás dos sindicatos, os partidos que atuavam também se colocaram na mesma situação. Isso demonstra que o sistema democrático demanda uma superação do sistema “representativo” para o nível “participativo” de democracia, e tal sistema político deve ser construído popularmente a partir de agora. Em outras palavras, está em boa hora para “o povo aprender a andar com as próprias pernas”.

                Além disso, o apoio considerável dos estudantes secundaristas aos seus professores mostrou-se um fato inédito nesta greve, evidenciando um boom de consciência política em resposta a um período de apatia e indiferença da juventude para com seu “eu” cidadão. Não podemos saber o que acontecerá na Assembleia do dia 10/05, mas algumas coisas podem ser previstas: o número de participantes pode diminuir em decorrência do descontentamento dos conflitos da ultima manifestação e do desgaste da greve, a Apeoesp pode começar a se sentir interessada pelo fim da greve para que não haja unidade com os professores do município, a repressão policial pode aumentar. O dia 10/05 será um dia para pessoas de coragem.

                Ainda que a greve acabe sem nenhuma de suas demandas atendidas, com sorte, ela será lembrada futuramente como uma divisora de águas. É nesse momento que devemos lembrar que as conquistas realmente significativas de uma sociedade, dificilmente são alcançadas imediatamente, e sim, num processo revolucionário permanente, que deve fluir desde mais aberta manifestação política ao mais singelo agir cotidiano.

                                                                                                                      Lucas Alexandre Andreto.












Praça da Sé