quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

Demonstrações do ódio social brasileiro.


            Sempre que leio notícias na internet, tenho o costume de ler também os comentários deixados pelos leitores. Por refletirem (ao menos em teoria) qual a opinião pública sobre os assuntos, eles se tornam interessantes.
            Ao ler um artigo a respeito de atuações do Movimento Sem-Teto na cidade de São Paulo, que tem ocupado prédios abandonados na tentativa de chamar a atenção e estabelecer um diálogo com as autoridades pela necessidade da Reforma Urbana (reforma que visa conseguir casas para as famílias que não tem), lê-se comentários do tipo: “Será que só quem não trabalha é que tem direitos? E nós, que ralamos muito para ter nosso próprio imóvel, onde ficamos? O governo não pode ficar dando imóveis, que no fundo saem do bolso de quem paga rigorosamente os impostos: do nosso bolso. É uma grande injustiça, um roubo!”.
            Em um artigo sobre o despejo de famílias ligadas ao Movimento Sem-Terra (MST) do assentamento Milton Santos, imperam comentários desse gênero: “Acabou a mamata... Entrem na fila do minha casa minha vida e façam como qualquer cidadão correto e adquiram o imóvel de forma honesta.”
            Sobre frases e poemas escritos como “grafite” nos muros das cidades, como por exemplo, “Você já abraçou alguém hoje?"  ou "Mais amor, por favor", escritos na tentativa de causar um momento de reflexão no correr do dia-a-dia das pessoas os comentários são: Poluição visual, desrespeito ao patrimônio público e alheio, emporcalha, enfeia, deixa a cidade com cara de abandono, desconstrói as linhas da arquitetura existente e só satisfaz o ego de meia dúzia de ditos "intelequituais".
            Essas declarações tornam-se importantes, na medida em que possibilitam ler as mensagens que estão por trás de uma mentalidade de senso-comum que impera em parcela da população.Elas tendem a criar um “charminho crítico” que se diz “estar do lado do povo”, mas na realidade deixam implícito o seguinte:
            No primeiro caso: O pobre que não tem dinheiro pra comprar uma casa, não o tem porque é vagabundo e não trabalhou o suficiente. Uma vez que consegui dinheiro pra comprar a minha, não é justo que quem não tenha condições de fazer o mesmo ganhe uma casa do Estado, mesmo sendo função deste também curar tensões sociais como a falta de moradia e exclusão social, e que o dinheiro dos impostos sirva (também) justamente para isso.
            No segundo caso: Participar de um movimento social e lutar para conseguir um pedaço de terra para produzir é crime. Não quero saber se você não tem condições econômicas se quer de financiar uma casa pelo “Minha casa, minha vida”, e caso tenha, espere pacientemente na fila deste programa assistencial por tempo indeterminado enquanto mora em lugar nenhum.
            No terceiro caso: Qualquer manifestação artística criativa de quebra do status quo é vandalismo que deve ser punido,e agrada a pessoas que não tem o que fazer e por isso criticam a sociedade e desenvolvem o pensamento ao invés de trabalhar. Vagabundos que também deveriam ser punidos.
            Nota-se que se essas afirmações fossem levadas a cabo pela política brasileira, viveríamos num Estado policial, que se mostra indiferente a tensões sociais, que criminaliza os movimentos populares, despreza o livre pensamento e condena abertamente a liberdade artística e de expressão. O funesto recado que esse tipo de comentário evidencia é a criação de uma cultura do ódio na sociedade brasileira que é alimentada pela classe média e que possivelmente paira entre nós certa nostalgia sombria dessa parcela pelos “anos de chumbo” existentes de 1964 a 1985.
                       


Lucas Alexandre Andreto.

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